Sobre a influência midiática, hiper-realismo e a justiça como espetáculo
- João Gabriel Balbino
- 6 de mai.
- 2 min de leitura
A mídia desempenha um papel fundamental na formação da opinião pública, mas frequentemente sai do seu papel informativo para se transformar em uma força direta que interfere tanto em julgamentos quanto em decisões judiciais. No contexto em que a espetacularização da tragédia se tornou um bem rentável, a justiça pode ser torturada a fim de atender a interesses comerciais e narrativos. Cenários como o do caso de O.J. Simpson e a crise da Escola Base mostram os riscos dessa manipulação, juntamente com o fenômeno do linchamento virtual, a curiosidade pública mórbida e o modo como a mídia constrói realidades próprias, como discutido por Jean Baudrillard.
O caso de O.J. Simpson, em 1995, se tornou um dos maiores espetáculos jurídicos da história. Acusado do assassinato de sua ex-esposa Nicole Brown e de Ronald Goldman, o ex-jogador teve cada detalhe de seu caso explorado pela mídia. Mais do que a análise de provas e depoimentos, o julgamento se tornou um debate racial e midiático. A defesa recorreu ao histórico de brutalidade policial contra negros nos EUA para censurar as provas produzidas, e a mídia propagou essa narrativa, transformando um caso criminal em uma experiência de entretenimento. Por fim, a absolvição de Simpson foi menos um desfecho legal e mais o resultado da história construída durante o processo.
No Brasil, o caso da Escola Base, em 1994, é ainda mais ilustrativo da interseção entre a mídia e a justiça. Baseados em acusações frágeis, jornais e estações de TV condenaram publicamente os proprietários e funcionários da escola por maus-tratos infantis. Sem qualquer evidência e antes mesmo da conclusão das investigações, essas pessoas já tinham suas vidas destruídas pelo linchamento midiático. Quando a inocência foi provada, o dano já era irreparável. Esse acontecimento demonstrou o desrespeito da mídia pela presunção de inocência e o poder destrutivo do jornalismo sensacionalista.
Com o advento das redes sociais, o linchamento virtual potencializou esse fenômeno. Hoje, qualquer pessoa pode ser “julgada” em questão de minutos, com reputações sendo destruídas antes mesmo de qualquer investigação oficial. A curiosidade mórbida do público sustenta essa relação, tornando tragédias em entretenimento e e o cobiçar de justiça pelo fausto de um espetáculo. Baudrillard, ao tratar da hiper-realidade, apontou que a mídia não apenas relata os fatos, mas os reconstroi de tal forma que sua narrativa se torne mais real do que a realidade em si. Nos julgamentos midiáticos, tal lógica se exprime de maneira cristalina: não é a verdade dos autos que importa, mas o que mais vende audiência.
Os programas policiais são um exemplo inigualável dessa exploração da tragédia com fins comerciais. Ao serem transmitidos diariamente, esses programas transformam crimes e tragédias em espetáculo, reforçam estereótipos e desrespeitam princípios básicos do direito, como a presunção de inocência. O objetivo não é informar, mas escandalizar, manter a audiência e alimentar um ciclo de medo e indignação que favorece a manipulação da opinião pública.
Antes de mais, há esta questão: ainda haverá espaço para a justiça ser exercida com imparcialidade ou ela está fadada a ficar refém do espetáculo das mídias? Enquanto a comunicação social for movida pelo lucro e o povo continuar consumindo tragédias como entretenimento, a dimensão da justiça ficará cada vez mais desequilibrada, favorecendo a audiência em detrimento da verdade.
João Gabriel Da Silva Balbino
Aluno do 5° semestre de Direito
Comments